terça-feira, 27 de outubro de 2009

O amor é um soco forte no estômago

O amor é um soco forte no estômago

Bem, fiquei matutando com meus pobres e insipientes neurônios qual seria o tema de minha primeira postagem neste blog. Pensei pra lá, fucei acolá, fechei os olhos meditando... E entre um serviço e outro, em meu expediente de trabalho, decidi: falarei sobre o amor. Nem sei o porquê desta minha decisão, contudo já que é moda ouvir “pombinhos apaixonados” dizerem que amam eternamente seus devidos e suas devidas amantes com um único mês de namoro... Então vou eu!
Certo dia, indo ao trabalho, devorava vorazmente um pequeno livro de Clarice Lispector chamado Felicidade Clandestina, composto por belíssimos contos. Com os olhos pregados nas doces páginas deste livro, nem percebia o trânsito na entrada da cidade de Campinas. Letargicamente, bebia uma após uma as palavras melífluas daqueles contos.
À certa altura da leitura, no conto O ovo e a galinha, entristeci-me com um trecho. Clarice, com a frieza e a dureza de um iceberg, dizia sem rodeios o que é o amor. Puxa, foi um duro golpe, doloroso mas realista! E eu que tinha tanta segurança, desmontei-me (risos).
Estava como um granito na página este trecho: “Amor é quando é concedido participar um pouco mais. Poucos querem o amor, porque o amor é a grande desilusão de tudo o mais. E poucos suportam perder todas as outras ilusões. Há os que se voluntariam para o amor, pensando que o amor enriquecerá a vida pessoal. É o contrário: amor é finalmente a pobreza. Amor é não ter. Inclusive amor é a desilusão do que se pensava que era amor.”
“Uau!"— pensei meio desiludido. Coloquei o livro mansamente sobre as pernas. Olhava desconcertado, através da janela do ônibus, os casais de namorados que andavam pelos calçamentos das ruas. Era cada olhar que trocavam que seus olhos retorciam, tornado-se vesgos momentaneamente. Quantos suspiros deixavam escapar, esbaforidos. Enfim, não caminhavam, levitavam pelas calçadas de Campinas, cheias de pombos carregados de piolhos e mendigos deitados enrolados com os seus míseros papelões agarrados às suas garrafas de cachaça, estas embriagavam-lhes fazendo-lhes esquecer das suas desgraças com um sono profundo.
Levitar. Exatamente isto que pensamos quando estamos enamorados por alguém. Dizemos estar bobamente nas nuvens. O coração, aparentemente tão leve, mal sentimo-lo em nosso peito. “Estou rico e leve de amor!” — concluímos de forma romântica.
Lembra-se do finalzinho do trecho do conto que partilhei? “...amor é a desilusão do que se pensava o que era o amor”, diz.
Exato. Tenho pra mim que o amor não é algo que faz-me voar e ser livre. Ao contrário, é um soco bem forte e duro no estômago, seu golpe leva-nos a prostrar com os joelhos no chão, suplicando à pessoa que nos atingiu com seu amor que olhe a nossa pobreza e fragilidade. É como se disséssemos com os joelhos genuflexionados: “dá-me a ti, querida, pois só a mim mesmo já não me basto”. Pura pobreza a nossa!
Penso que um relacionamento amoroso a dois se assemelha ao acasalamento de um casal de porco-espinhos. A aproximação dos dois acontece, todavia é certo que há a realidade das espetadas.
Sentencia Goethe: “O amor não se deve queimar, mas também aquecer”. Em dias hodiernos, os que predominam são amores e relações que queimam ferozmente em tão pouco tempo, porém não aquecem os corações. Amores superficiais e que só ficam na casca, não são aprofundados até a essência. Não é de se estranhar, pois as relações que presenciamos hoje — profissionais, familiares e etc — estão impregnadas de um individualismo doentio e medroso que não permite a abertura e o conhecimento profundo da outra pessoa.
Adoro o livro do Cânticos dos cânticos, um dos mais belos livros que há na bíblia. “A amor é forte como a morte”— diz um trechinho do livro. De fato, como ninguém escapará da força e realidade duras da morte, também será assim com o amor: fatalmente teremos que encará-lo na sua dureza e realidade como ele, o amor, o é.
Enfim, iniciei citando Clarice Lispector então concluirei com ela: “Todos os dias, quando acordo, vou correndo tirar a poeira da palavra amor”. Presumo que este é o anseio de qualquer criatura, retirar qualquer sujeira que possa impedi-la de viver um amor verdadeiro.

Um dica para os que gostam de escritos amorosos: consultem na Internet Roland Barthes, Fragmentos de um discurso amoroso.

Paz e até a próxima estação!!!

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